As ruas testemunham segredos, as maçãs do rosto dos apaixonados cristalizam juras de amor da cor da cereja, a doçura rósea cobre os céus, e as árvores vestem-se de branco naquela que dizem ser a cidade das mais longas e quentes noites de Verão. onde não corre uma aragem. Depois de receber um postal primaveril enviado pelo Renato, Quioto tornou-se um destino premente para a aridez dos meus sentimentos. ao contrário da cidade de Tóquio que o meu saudoso Ozu me deu a conhecer. Era eu muito novinha quando visitei Japão pela primeira vez e fui apresentada o Ozu. tinha doze ou treze anitos... Desde então a empatia foi mútua e a cumplicidade desmedida, apesar da minha tenra idade. naquele tempo aos treze anos ainda éramos crianças. Desde então, Ozu convida-me regularmente, e faz questão que fique em sua casa. A minha admiração é tão grande que me esqueço de visitar outras localidades além de Tóquio. Deixo-me ficar em sua casa, embevecida, e esqueço-me dos dias que entretanto vão passando. faz tanto frio lá fora... Ozu nunca me deu a conhecer a Primavera de Quioto, nem o perfume das cerejeiras em flor, nem as chinelas em pés descalços dos apaixonados, nem o sol de Quioto, nem os gelados de leite de soja. E foram tantas as vezes que lhe pedi para ser meu cicerone... Mas declinou. sempre. Nunca fui a Quioto. Nunca. Visito sempre Tóquio. Invariavelmente. Num Inverno frio, sombrio, soturno e sombrio. Quiçá, a razão da escolha de Ozu por esta estação em particuar seja para me privar e evitar dos eventuais incómodos sazonais de alergias, sinosites e rinites próprios das meias-estações. Conheço Tóquio. Escura e fria. A do saké bem fervido, a dos olhares melancólicos e resignados, a das mãozinhas que se esfregam, a da cidade habitada por anatomias apenas sugeridas e abafadas por envelopes de fazenda grossa na noite cerrada sombria e soturna, por entre os quais espreitam olhos a meia-haste. sem força para afugentar o frio. olhos escondidos que nem dão contam do tempo que passa. Fico com frio. Ozu empresta-me um casaco. vamos ao café. apresenta-me Akiko, uma senhora que chora sem me esconder as lágrimas. Cumprimentamo-nos e da janela do café olhamos para a rua. Árvores despedidas, sem flor, folha, ou fruto é tudo o que vemos. Para a próxima vou a Quioto e convido Akikko...
...e esgravata.
terça-feira, 1 de abril de 2008
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